Todos sabemos que o avanço da tecnologia digital vem causando no mundo muitas mudanças. Uma questão interessante seria se essa transformação seria capaz de realmente mudar a cultura, no sentido utilizado por Maturana, uma rede fechada de conversações.
Por um lado, sob o ponto de vista da forma e dos meios pelos quais a cultura é criada e reproduzida é óbvio que a sociedade global mudou profundamente nos últimos anos com o uso da internet e dos meios digitais em rede. Na realidade as coisas já começam a mudar a partir da era industrial, aprofundando-se com as diversas formas de controle e comunicação que surgem com o mundo digital. Com ele tudo é possível, não há limites para as formas de representação, bastando aumentar a velocidade do processamento dos bits pelo sistema em rede. Claro que a velocidade da evolução dessas novas formas de mediação tecnológicas depende da criatividade e adoção das novidades pela sociedade, o que vem aumentando na medida em que aqueles limites de infraestrutura e de utilização das novas formas são suplantados paulatinamente. E a tendência é para cima, mais serviços, mais utilização, mais pessoas utilizando. Este processo atinge, evidentemente, as conversações, que podem ter uma melhor gestão e facilitação na troca de informações e aproximam quem antes nem pensaria em poder participar da roda.
Por outro lado, sob o ponto de vista do conteúdo, a coisa pode não ser tão otimista ou tão fácil. Isto porque o continente molda o conteúdo, mas não o transforma. Significa dizer que a mudança das conversações depende mais de uma mudança de atitude no pensar e principalmente, no agir. De nada adiantaria ter ferramentas maravilhosas que permitem aproximar as pessoas se as mesmas investem seu tempo e criatividade em puro entretenimento ou nos velhos jogos de poder e violência. A pergunta, portanto, é em que medida as tecnologias digitais poderiam favorecer a mudança do conteúdo das conversações. Eis o gargalo da questão, mas há uma hipótese interessante nesse caminho: o fato de que as pessoas antes passivas ou alijadas de todo esse processo começarem a participar dele, o que pode fazer surgir novos pontos de vista além dos temas construídos e organizados de forma hierarquizada. Aqui, a horizontalidade da comunicação pode ser um espaço de emergência de resistências aos conteúdos hegemônicos ditados pelos mercados, pelas corporações, pelos governos e mídias. Enfim, pela própria sociedade patriarcal que aí está. É o exemplo do sucesso tão atual das redes sociais. Sabemos que muita coisa que rola nessas redes é pura bobagem, mas as verdadeiras pérolas podem mais facilmente ser descobertas e compartilhadas muito rapidamente, gerando ondas e movimentos imprevisíveis. Quiça, muitas conversações revolucionárias possam surgir daí e de outros meios digitais, como uma flor de lotus nasce da lama...