Época de farra do boi na vizinhança: Crime e castigo?

A Declaração Universal dos Direitos Humanos diz em seu artigo I que todos os Homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. O artigo XXVII reza que todo homem tem o direito de participar livremente da vida cultural da comunidade. No mesmo caminho vai a nossa lei maior, a constituição federal. A questão que se coloca de maneira bem resumida é porque a farra do boi em SC, de uma tradição cultural local centenária virou um caso de polícia. Porque a lei e a sua interpretação preferiram criminalizar ao invés de regular dentro de um processo educativo como bem fez Portugal. No cerne da questão está o fato de que nós brasileiros não “gostamos” de respeitar a constituição, mesmo nos valendo dela, principalmente quando estão envolvidos direitos genéricos como cultura e direito de minorias que atinjam de alguma forma o senso comum geral. As conseqüências disso são claras e maléficas. A lei que criminaliza a farra do boi está de tal forma sacralizada e idolatrada que parece justa e legítima. Tem jeito de coisa do século 19 no qual uma categoria de novos privilegiados diz o que é direito e o que não é, desconhecendo a própria constituição. Discriminação que decorre de lei não é discriminação. Se valorizássemos a nossa constituição federal refletiríamos melhor sobre os paradoxos que ela traz e sobre os direitos que estão sendo cassados por esta proibição em particular. O fato é que conhecemos bem o código civil (regula as relações privadas e nas faculdades estuda-se durante quatro anos), mas não ocorre o mesmo com o direito constitucional (regula as relações públicas e estuda-se durante quatro meses). Com essa mentalidade este se torna apenas perfumaria, uma espécie de manifesto político que na medida dos interesses se aplica. Evidente que no primeiro mundo isso não funciona assim, os princípios e normas constitucionais são interpretados holisticamente e não são apenas programáticos, mas determinações que devem ser atendidas nem que dentro de um processo de satisfação progressiva. Neste caso, existe um bem maior que deve ser protegido, a cultura de uma minoria. Mas o que é isso diante dos abusos que se faz contra os animais? Melhor usar a força da lei da maioria para criminalizar? Evidentemente, é mais difícil regular a atividade e educar para eliminar esses abusos. Em contrapartida, é mais fácil acreditar que mudamos a realidade por decreto. Isso, além de ser ingenuidade tem um que de hipocrisia.